Chamo o elevador. A porta abre, e o ascessorista sem rosto me eleva até o nono andar. Tiro o casaco e me jogo no sofá. Oito e trinta e sete no meu celular. Desligo a televisão após uma rápida sapeada pelos inúmeros canais, casa qual com seu apresentador de botox no rosto e um vazio no peito. De cada cinco canais, seis estavam nos comerciais: dois de cerveja, três de carro e outros dois de pasta de dente. O rádio é ligado. pelo menos não toca funk no rádio, mas o rap é um lixo quase igual. Desliso os dedos pela prateleira e escolho um CD de Milton Nascimento.
Pego a câmera digital e a penduro no pescoço. Destranco a janela, e a escancaro. Nem sei porque eu sempre a tranco. Quase nunca chove, não há real necessidade dela ficar fechada. Mas dia após dia eu a fecho e passo a chave, só para poder abri-la no outro, e sentir a baforada de ar quente de fora do prédio para dentro da minha sala, passando pelo meu rosto. Escancaro a janela para ver cada vez de novo o rosto das já conhecidas e velhas amigas montanhas, de uma vez. Apago as luzes do apartamento, e apagaria também as da ruas, para melhor ver as estrelas, tão imutável companhia. Fito cada uma delas com paciência e calma, me perguntando se mais alguém está olhando para ela junto comigo. Minha imaginação vagueia.
Pouso os olhos num distante navio. Mal consigo ver as ondas se quebrando na praia, mas vejo o navio, que é tocado pelas mesmas ondas que as dezenas de turistas. "Eles não vão para casa nunca? Não sabem que horas são?"
Uma andorinha mergulha na minha frente e me tira do transe, levando minha atenção aos turistas na rua. Outras dezenas de visitantes, tirando fotografias de tudo. Assim como as singelas estrelas, eles nem imaginam que estão sendo observados.
Tiro uma foto da Lua e vou dormir.
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